CCBS CAMPUS II
Material didático
HISTERIA
VII - A etiologia
Vejamos o que pode levar ao tipo histérico de estruturação da personalidade. Neste tipo de personalidade o conflito se relaciona ao Édipo e à castração. Freqüentemente temos uma menina fortemente apegada aos pais, que se vê colocada, dependendo das circunstâncias, como o par de um ou de outro. Isto se reflete na sua vida adulta no ‘gosto’ pela repetição de situações triangulares. É como se houvesse uma eterna dúvida sobre sua identidade sexual: o que sou, homem ou mulher? A diferença sexual anatômica é percebida como castração, e a impele a reagir exagerando a importância de tal diferença através de uma hiperfeminilidade, ou minimizando-a através de um estilo unissex.
A dificuldade em relação à identificação feminina está relacionada a um modelo feminino infantil inadequado. A mãe da histérica freqüentemente não deseja seu companheiro, não se valoriza como mulher terna e sensual, hostiliza seu marido de forma velada ou manifesta e tem um relacionamento frio com sua filha. É uma evidência clínica que o complemento desta mãe é, com freqüência, um pai submisso ou não, mas inseguro na transmissão da lei, e que trata de compensar o rechaço da esposa, voltando-se para a filha. Ele a erotiza de forma manifesta ou latente, reforçando suas fantasias de transformar-se em sua parceira. Às vezes, a mãe da histérica apresenta-se como vítima do marido: ele não a compreende, ele não a ajuda, ele é inculto, grosseiro, sexopata, etc. Outras acusa a própria sociedade de ser injusta, de marginalizar a mulher, de privilegiar o sexo masculino. A filha percebe neste discurso um rechaço de sua identidade sexual, ao mesmo tempo que constrói na fantasia um ideal de parceiro inalcançável: o príncipe montado no cavalo branco, que sua mãe não conseguiu.
Neste contexto, em que a mãe desqualifica o homem que escolheu para compartilhar sua vida e o pai aceita permanecer nesta união, fica difícil atingir uma identidade sexual firme. Que modelo de mulher e de homem pode edificar uma filha nesta trama familiar ? Algumas vezes ela irá buscar este modelo feminino de identificação em outras mulheres, amigas, mulheres mais velhas. Outras, sente-se a vontade como a queridinha de um casal, identificando-se com a mulher, compartilhando seu desejo e, até, usurpando seu objeto. Por exemplo, seduzindo o marido das amigas.
Observa-se em algumas histéricas uma acentuada dependência de seu companheiro. Isto se deve a que no passado a dependência infantil foi mal tolerada pelos pais, notadamente pela mãe. Numa tentativa de compensar o rechaço materno, a menina faz um deslocamento dessa dependência, na vida adulta, para o marido. Muitas vezes, este acaba por se transformar no secretário de uma intelectual, na “babá” de uma agorafóbica ou naquele que vela o sono de uma insone. Entretanto, essa dependência adquire um matiz hostil, refletindo a forma como a mãe tratava seu pai ou a ela própria.
A ausência de desejo entre os pais da histérica faz com que o pai aproxime-se perigosamente de sua filha e a obrigue a erigir poderosas barreiras contra as pulsões sexuais na fase edipiana positiva. O resultado é uma inibição da genitalidade e um deslocamento do erotismo para as fantasias e devaneios. O que se traduz na idéia comum de que a histérica seduz e depois foge do encontro sexual. Outra conseqüência é a dissociação entre o amor genital e o amor terno: o prazer só é obtido quando não há envolvimento amoroso.
No caso do homem histérico as coisas se passam de forma semelhante. De um modo geral, o pai (frágil ou despótico) foi inseguro no exercício da lei* . A mãe o desqualifica de forma sutil ou manifesta e aproxima-se cada vez mais de seu filho, conduzindo-o a uma problemática semelhante à da histérica mulher. O comportamento sedutor também é observado aqui, o histérico parece estar sempre insatisfeito com o que tem e achar mais valioso o que os outros possuem. A insatisfação é, portanto, o estado de alma permanente do histérico e, é preciso lembrar, que isso vale tanto para a histeria masculina quanto para a feminina. Essa insatisfação resume-se na seguinte afirmação: “O que os outros possuem parece-me preferível ao que eu possuo”. Ser amado por todos e por todas, não perder nenhum objeto de amor é um desejo que só pode ser satisfeito no sonho ou na fantasia.
O histérico é tão inseguro quanto a sua identidade sexual quanto a histérica, necessitando por isso cobrir-se de insígnias que o assinalem como alguém super viril : carrões, super mulheres, etc. O comportamento donjuanesco serviria aqui de exemplo.
O diagnóstico de estrutura histérica no homem não é raro. O de estado neurótico caracterizado como tal é muito mais. Entretanto, quando a neurose eclode e o homem histérico se decide a procurar um analista, o faz por três razões:
a) Problemas da atividade sexual: impotência, ejaculação precoce, dúvidas em relação à sua sexualidade: “Doutor, sou homossexual?”.
b) Angústia que se concretiza em discretas e secretas fobias: medo de contágio, impossibilidade de comprar para si sapatos ou uma gravata, como símbolos fálicos, sem a intervenção da esposa ; ou ainda o imperativo obsedante, senão obsessivo, da lavagem pós-amorosa imediata, como fidelidade narcísica às recomendações de uma mãe libertária e intrometida, que tratava sempre com o filho dos perigos de Vênus.
c) Fracassos e compensações. Isto se expressa na inaptidão por assumir altas posições, promoções, etc. Nestes momentos geralmente ele adoece. Abre-se então a porta para as toxicomanias menores: éter, anfetaminas ou medicamentos diversos, que o ajudam secretamente a manter um papel que é sempre supercompensação de um sentimento de inadequação ao que ele tem de viver. Nestes casos, o álcool também pode ser utilizado.
Os mecanismos de defesa mais usados na histeria são o recalque e a identificação. Algumas vezes, podem ocorrer mecanismos mais primitivos como a projeção . Neste caso estaremos diante de um quadro mais regressivo, a psicose histérica, onde não faltam os delírios e as alucinações, exemplificado pelos delírios de possessão demoníaca tão freqüentes no final da Idade Média e início do Renascimento.
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